domingo, 20 de abril de 2008

A Dislexia do Ser e a Propulsão ao Nada: A Teoria dos Ciclos Repetitivos I

Hoje é sábado. Talvez uma nova noite para começar uma conversa antiga. Aparentemente, a mesma conversa. Só, aparentemente. Sentados em um banco de praça, cogitamos sobre as repetições de casos específicos em determinados momentos da vida.
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O nome dele seria Flávio, caso conseguisse subir na vida como o pai. Flávio alguma coisa com Júnior no fim. Seria um rapaz simpático, pena que recebeu um novo nome, Sílvio. Havia uma dificuldade dentro de si. Este saberia lidar facilmente caso as meninas do colégio aceitassem a nova opção que lhe vinha à mente. Qual a opção? Não sei, seria a melhor resposta.
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"A dificuldade de entender-se está cada vez mais próspera,
Mas continuo a desistir disso.
Sempre tenho sentido para me resgatar
Mas vem você sempre a me lembrar que não posso controlar os meus sentidos. Logo, o resgate é teatral.
O mundo real plasma em uma imaginação ilusória e cria, consigo mesmo, uma realidade distorcida, abrupta e lógica. Além de tudo, lógica. Às vezes, torna-se difícil entender como a ordem de propriedades aparecem e desaparecem, como alguns eventos aparecem, somem e repetem outra vez.
Para quem eu estou escrevendo mesmo?
Para mim não é.
Para quem?
Ah, melhor é dormir. Procurar respostas para tudo cansa."
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Uma decisão estava posta na mesa da praça. Eu deveria escolher o caminho a seguir.
Flávio conheceu Sílvia numa festa esquecida na memória de todos. A memória criou a escassez de um evento particular, uma separação, a minha separação. Logo após ambos Flávio e sua nova amiga se entreolharem, chegou a hora de subir à mesa. Todas as pessoas da festa olharam para mim. Subi à mesa com um copo de vinho na mão esquerda e com um microfone na mão direita. Fiz um discurso de algum tempo pequeno para mim e imenso para quem ouvia.
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"Qual a validade de se estar aqui? Se existe validade, mesmo que seja penetrante, não há lógica.
Qual a lógica de se ter um par de olhos ou de se beber vinho polonês?
Meu amigo Darwin estava certo."
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Risada em conjunto. Senti-me um idiota num instante, parecido numa época de colégio onde a idiotice era um meio interessante de se "manter" em algum grupinho de garotos idiotas. Logo, tive que rebater em todos os grupinhos idiotas da infância, como se a escolha fosse algo que não se pudesse escolher.
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"Vocês são todos uns idiotas"
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As risadas cessaram. O mundo de baixo, as pessoas, a platéia parou. Os olhares se tornaram fixos em um único ponto, para ser mais preciso, em meu par de olhos castanhos escuros. Assim eu senti o reverso controle da minha raiva. O que eu quero dizer é que minha raiva não vazou sozinha na frase anterior. De forma conjunta, também saiu o medo. O famoso medo de não ser aceito pelo grupinho idiota, olhares de reprovação e o fim da celebração "caia fora!".
Ficou sim mais difícil de entender. Tentei desviar o olhar de todo o mundo abaixo da mesa e olhei para os fundos. Meus olhares procuraram a fuga, mas, além disso, encontraram um retorno. Flávio e Sílvia estavam em um avançado namoro, às escondidas, encontrando caminhos obscuros para reencontrar suas bocas, enquanto meus olhos fixaram nesta imagem estranha tentando procurar a fuga.
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Iniciei uma crise de choro interminável. Esta era nova, novíssima e incontrolável por ser nova e indecifrável. A imagem da cena tornou-se hilária, já que milhares de opostos haviam convergido para um único ponto: pessoas olhando para um choro desbravado, de modo que os olhares foram mais raivosos do que transtornados. A mesa se entortou e veio ao chão, junto com o meu corpo acima da vidraria da cozinha. Tudo quebrado de novo. Todos vieram me ajudar. Levantaram-me e avistara um rosto cortado, soberbado, infeliz. No meio da multidão suada e de mãos em meu rosto, afinal, todos eram meus colegas de ensino médio, avistei para minha fuga. Realmente, uma fuga estonteante que continuava a se encontrar em um par de bocas e que me fazia sentir inveja e raiva.
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"Filhos-da-puta"
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Afastei muitos da minha frente. Muitos a me perguntar se eu tivera bebido demais ou se eu passei da conta. Nada profundo, ninguém entendia, mesmo eu cansando a dizer que as coisas jamais fossem unilaterais, todos continuavam a interpretar o mundo desse jeito. Os únicos que não se afetaram com a minha afirmativa de ódio, continuavam a se beijar. Eu não poderia fazer nada, então, resolvi correr o mais rápido que pude. Agora, minha fuga estava no além da porta de entrada da casa. Pus o pé direito além do esquerdo e iniciei um bravo impulso no lado direito do meu tornozelo esquerdo. No terceiro pé, no meio da trajetória para a fuga, tropecei em mim mesmo e realizei uma queda diretamente ao chão. Olhei para cima, tentavam me levantar de novo, e percebi que a fuga havia passado por mim fazia tempo, antes mesmo de tentar resgatá-la nos novos namorados.
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Eu, realmente, deveria ser aceito por mim mesmo. Jamais deveria ter fingido na infância. A manhã seguinte à festa está prestes a acontecer e eu estou ainda sentado, sujo e fedorento, na esquina da minha rua, temendo entrar em casa.

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